sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

Decálogo dos equívocos florestais brasileiros




Durante o ano de 2011 as discussões havidas no Congresso Nacional e em segmentos da sociedade civil e da imprensa fizeram aflorar uma série de equívocos técnicos e conceituais envolvendo florestas.
As enchentes, os deslizamentos de encostas, as secas, a destruição impiedosa de núcleos urbanos e infra estruturas de transporte, de comunicações, de energia levaram setores da sociedade a pensar que bastava ter mais florestas que essas catástrofes estariam resolvidas. E que tal se daria através de leis severas. Aliás, essa fixação por mais florestas pode confundir não só o entendimento como a própria solução dos problemas.
Examinemos com mais detalhes quais foram os principais equívocos veiculados:

Floresta nativa é melhor do que floresta exótica?

 

Floresta é um conceito funcional, baseado na sua contribuição ambiental. A ONU se empenhou em aprimorar um conceito que desse conta da multiplicidade de serviços ambientais (ecossistêmicos) prestados pelas florestas e o IPCC chegou seguinte definição no Protocolo de Kyoto (IPCC): ”Floresta é definida como um terreno com área mínima de 0,05 a 1,0 hectares, que tenha cobertura de copa de árvore superior ao limite de 10 a 30 por cento e árvores com potencial de altura mínima de 2 a 5 metros na maturidade, in situ. Estandes naturais jovens e todas as plantações que atingiram ou tendem a atingir esses limites são consideradas florestas. Áreas que normalmente formam parte de uma área florestal e que estejam temporariamente sem estoque, devido à intervenção humana como corte ou de causas naturais e que se espera ser convertida para floresta, também devem ser consideradas floresta pelo acordo”. Por essa definição só deixa de ser floreta no Brasil as formações de campos como os Pampas, as pastagens e as culturas anuais. Apesar de haverem propostas no sentido de se diferenciar florestas nativas de plantadas no âmbito do Protocolo, não existe consenso em termos de diferenciação de serviços ambientais prestados. Não há, portanto, um juízo de valor quanto ao que é melhor: exótica ou nativa.

Floresta “produz” mais água?

 

Essa afirmação é produto de um total desconhecimento do ciclo hidrológico. A “produção” de água, para o senso comum, é a disponibilidade para o uso humano: industrial, doméstico, irrigação, etc.. Ora, áreas com florestas reduzem essa disponibilidade. Em linguagem técnica, deflúvio é a vazão média do curso d’água que reúne a água produzida por determinada bacia hidrográfica. Existem muitos experimentos que mostram que, quando a bacia é reflorestada, o deflúvio diminui. Quando a floresta é cortada, o deflúvio aumenta. A razão é que, nas áreas cobertas com floresta, a evapotranspiração (água da chuva que é utilizada pela planta e vai para atmosfera, mais a água que é evaporada diretamente) é maior: a água ao invés de ir para o rio vai para a atmosfera. É verdade também que terras bem cuidadas e terras cobertas por florestas absorvem mais água das chuvas fortes. Esta água demora mais para chegar aos rios, o que regulariza ao fluxo e diminui as enchentes. . Assim, ao invés de aumentar, as florestas diminuem a “produção“ de água, aumentando por outro lado as reservas subterrâneas, que abastecem os mananciais no longo prazo.

Eucalipto seca a terra?


Toda floresta de porte elevado reduz o deflúvio, e, portanto, a disponibilidade superficial, aumentando por outro lado a disponibilidade futura, conforme explanado no item anterior. Daí a importância de manter florestas para preservar os mananciais. Por outro lado, a presença de florestas tende a facilitar a absorção de água pelo solo, reduzir as enxurradas, reduzir e regularizar o deflúvio.

Floresta nativa aumenta a biodiversidade?


A diversidade biológica é um dado, não pode ser aumentada, a menos que de introduzam espécies “exóticas” no ecossistema Se houve uma simplificação do ecossistema, como no caso da agricultura, ele poderá ser reconvertido em parte, porém, jamais voltará a ser o que era. Passa a se constituir num novo ecossistema e jamais voltará ao original. Se o objetivo da floresta for a biodiversidade esse é um caminho. Se for a captação de Carbono ou proteção hídrica poderão haver outras alternativas.

Floresta nativa produz oxigênio?


Florestas como a Amazônica, ou mesmo áreas grandes e preservadas da Mata Atlântica, do Cerrado, da Caatinga, do Pantanal estão no que se chama de homeostase,( sistema está em equilíbrio),onde a produção de oxigênio é igual ao consumo, bem como a captura e estocagem de Carbono. 

Desmatamento aumenta CO2?


É importante frisar que CO2 não é poluição: é um gás fundamental para a vida na Terra. Mesmo que haja um desmatamento seu teor na atmosfera permanece absolutamente igual e, se não houver a queima do material desmatado, a absorção de CO2 até aumenta através da rebrota do material cortado. Portanto, o que aumenta o dióxido de Carbono não é o desmatamento. É a queima ou mesmo o apodrecimento da madeira e da matéria orgânica que existia na floresta. Se a área desmatada for abandonada e a floresta crescer novamente haverá reabsorção do CO2 através da rebrota do material cortado. O que de fato interfere no ciclo do Carbono é a queima de combustíveis fósseis que têm um período de reabsorção de milhões de anos. 

Florestas protegem as nascentes?


As nascentes, de um modo bem simples, são afloramentos do lençol subterrâneo de água: é uma das “saídas” da água reservada no subsolo. A água costuma sair por onde encontra menos resistência. Não há como “impedir” uma nascente. Bloqueada aqui, aflora acolá. Protegê-las é importante do ponto de vista da qualidade hídrica e pesquisas indicam que, de modo geral, qualquer tipo de vegetação é eficiente nesse sentido. O importante é a existência de vegetação e não que a composição desta seja feita com espécies de “mata ciliar”

Deve haver mata ciliar em todo corpo d’água?


Existem muitas formações naturais que não possuem mata ciliar. As regiões de campo, os campos de altitude, as savanas, as regiões de várzea, muitas vezes não têm mata ciliar. A nascente do Rio São Francisco, por exemplo, é uma delas e nem por isso deixa de estar protegida. Nos corpos d’água artificiais, nas represas, as faixas de proteção de suas margens também terão características artificiais, serão um novo ecossistema. Assim, a recomposição que se faz nas suas margens é tecnicamente de outro tipo; não pode ser conduzida como se fosse mata ciliar. O importante é manter as margens que estejam sujeitas á erosão com vegetação suficiente para evitar o assoreamento dos corpos d’água e assim, preservar a qualidade das águas. Tudo vai depender das condições locais de solo, de clima, de relevo, de manejo.

Porcentagem de florestas em cada propriedade salva biodiversidade?


Fragmentos pequenos geram endogamia e proliferação das espécies que não tem predador, ou “inimigo natural”. Isso acontece porque nessas pequenas áreas a cadeia trófica é incompleta. A existência de florestas ou fragmentos é importante pela polinização, controle natural de pragas, abrigo de fauna e conservação da flora local, mas, insuficiente para manter os processos ecológicos integrais.

Espécie florestal exótica é invasora?


Espécies introduzidas assim como as nativas apresentam diversas formas de propagação e de interação com as áreas naturais se não forem corretamente manejadas podem ter um comportamento agressivo e se tornarem “invasoras”. A agricultura é totalmente baseada em plantas introduzidas que estão presentes em todo o território nacional. O fenômeno de alteração de áreas naturais por plantas invasoras é um fenômeno local, administrado por intermédio de manejo apropriado.

(*) Os autores são engenheiros-agrônomos. Castanho é pesquisador científico do Instituto de Economia Agrícola, IEA/APTA/SAA, e Macedo é assessor da presidência da Sociedade Rural Brasileira, SRB.

Referencia: site do jornalista Antonio Reche: Reche.com.br

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